sexta-feira, 28 de junho de 2013

Uma greve de protesto em defesa de um país que querem destruir

 
Na tentativa de condicionar, à partida, a greve desta quinta-feira, o primeiro-ministro Passos Coelho, afirmou que “O país precisa menos de greves e mais de trabalho e rigor”.
Lá foi concedendo que o direito à greve é inalienável mas que, enfim, na situação ideal, deveria ser utilizado quando não prejudicasse ninguém. Tipo, fins de semana, mas nem para todos os sectores e nas férias, no caso dos professores.
Na situação ideal, aprendida com Salazar, e não será por acaso que há uns meses foi fotografado, sem o querer, com um livro sobre o Ditador debaixo do assento da sua viatura, o melhor era nem haver greves que prejudicassem o normal funcionamento do país. Ou talvez suspendendo a democracia. Por alguns meses ou anos.
Mas é da concretização destes desejos íntimos que o homem está livre: o povo vai muito para além dos seus correligionários (muitos deles também paralisaram) e vai muito para além de 2015, altura em que dele nos veremos livres, sendo que já hoje é tarde!...
O mais grotesco da situação é que aparecem amplificadores, aqui e ali, sobretudo nos fóruns radiofónicos, a seguir esta estratégia anti-nacional de dividir os portugueses entre os que hoje trabalharam, mesmo que ontem e amanhã não façam nada, e os manguelas que fizeram greve.
Aliás, este governo tem tido como visível missão cavar um fosso entre diversos sectores da sociedade portuguesa, colocando cidadãos contra cidadãos, na crença de que assim reinará melhor.
Começou por promover a revolta dos jovens contra a “geração grisalha”, tentando fazer crer que os mais velhos são responsáveis pelo facto de as novas gerações não terem emprego, quando a responsabilidade é de todos os Coelhos, Gaspares e Cavacos que nos têm desgovernado nos últimos trinta anos.
Depois, ensaiou dividir os trabalhadores, entre os que exercem no sector público, alegadamente privilegiados, e os que trabalham nas empresas, sempre mais empreendedores, mais talentosos, mas arriscados, enfim, mais “patriotas”, como essa gente julga.
Finalmente, e nas últimas semanas, o governo empenhou-se fortemente em colocar alunos e pais contra essa classe parasitária e pouco trabalhadora como suas excelências consideram os professores, e todos os funcionários públicos.
Nesta quinta-feira, procurou jogar trabalhadores contra patrões, no sector privado os utilizadores dos serviços públicos contra os servidores do Estado.
É esta a estratégia abominável deste governo: promover a guerra entre os portugueses; colocar portugueses contra portugueses, novos contra velhos, públicos contra privados, alunos contra professores.
A greve foi estupidamente dramatizada nos últimos dias, por motivos meramente políticos, dos governantes e suas redes clientelares.
Falaram, na imprensa, em perdas de mais de 500 milhões de euros, se a greve fosse geral (que nunca é), quando nem o Menino Jesus já acredita nestes números.
É outro papão que dá jeito aos políticos, nestas ocasiões.
É claro que não há qualquer credibilidade nestas cifras e nesta dramatização. Ainda a semana passada, Lisboa parou no feriado de Santo António e esta semana no Porto, em Braga e em Guimarães, para citar algumas cidades, não se trabalhou, e não consta que tenha transpirado tanto desassossego.
Fiz greve.
Por tudo o que antecede, mas por outras razões.
Para protestar contra um governo em que nunca acreditei, e que simplesmente já não funciona, a não ser para as televisões e os jornais.
Para protestar contra uma estratégia política e ideológica de desmantelamento do Estado Social e de destruição de tudo quanto é público em Portugal, da escola à saúde e à segurança social. O claro e indisfarçável objectivo é desarticular e degradar a oferta pública para oferecer esses sectores à iniciativa privada.
Para protestar contra uma política que tem como propósito estratégico o empobrecimento generalizado da população, dos trabalhadores aos reformados; a criação de condições para empurrar os mais jovens e qualificados para os caminhos da emigração, como há meio século se não via. O que esta gente pretende é “reconstruir” um país “pobre, miserável mas honrado”, na senda de Salazar, que muitos gostariam de recuperar. Outra coisa não representa esta ideia que a velha lengalengam muito em voga por estes dias, de que temos de ter credibilidade perante os nossos credores, cumprir as suas determinações. Pobres mas honrados!
Para protestar, assim, contra um governo vergado caninamente aos ditames de uma Europa podre, tecnocrática e barbaramente capitalista.
Contra um governo que em dois anos de vigência demonstrou, sistematicamente, estar mais preocupado em agradar aos ditos “mercados” que nos exploram até à medula do que em defender os interesses e anseios dos portugueses.
Nessa lógica, a Passos e Gaspar tanto importa que haja 1 milhão como 5 milhões de desempregados, desde que seja essa a vontade dos nossos credores. Nem sequer estou a caricaturar, porque esta gente é capaz de tudo.
Por isso, e pela situação de medo que está a regressar à sociedade portuguesa, como há muito não se via, um salazarismo encapotado e miserável, a greve fez todo o sentido.
A greve foi, mais uma vez, o que foi. Uma grande manifestação de descontentamento, de revolta, de indignação pelo rumo que o país está a tomar, e que não tem a ver apenas com a crise e a necessidade de recuperação das finanças públicas.
O que está a passar-se é outra coisa, mais execrável e absolutamente ideológica. Era bom que os portugueses abrissem bem os olhos para o que está e vai passar-se.
Porque se preparam para transformar Portugal no que ele nunca foi, nem legitimamente deverá vir a ser!

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